@mode: apanhada!

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Modelito da minha saudosa tia Leontina, com caderno finamente encadernado em papel de embrulho “Art Déco”! Quem nunca?! Nos primeiros anos era a minha mãe que encadernava, depois a tarefa começou a ser minha. Aos rolos de papel sucederam uns rolos de plástico. Hoje, já quase ninguém se dá ao trabalho e manda plastificar… Quem se lembra desta tarefa e do cheiro dos livros escolares novos?! Como era fantástico folheá-los com aquele espírito de SPOILER!

Corria o ano de 1983-84, estava eu na Escola do Caneiro, na Madalena, em Chaves. Era aluna da exigente “Prof. H”… Fomos a última turma que a senhora acompanhou. Soube, nestas férias do verão, que ainda vive e pensei para comigo que, afinal, “o tal” ditado não falha. Não bastasse bater-me todos os dias (TODOS!), com réguadas, puxões de orelha, bofetadas e aquelas “canadas” com maldita e comprida cana-da-Índia, ainda tinha a minha mãe a dizer-lhe: “Bata-lhe, senão ela não aprende!”. Mas pior… eu morava na rua paralela à escola e a senhora era minha vizinha!
– "Arménia, estás a brincar na rua?! Quero ver se amanhã tens os deveres bem-feitos!”.

Era o HORROR! Tinha aulas apenas de manhã, até às 13:00, e nesses dias revia os trabalhos todos. Muitas vezes ainda ia à varanda, pedir à minha mãe para ver se tinha tudo certo, mas ela praguejava comigo, dizia que tinha muita roupa para lavar no tanque e o jantar para fazer. No dia seguinte, a primeira tarefa da professora era corrigir os trabalhos de casa e, lamentavelmente, a memória nunca lhe faltava! Apertava e torcia a nossa orelha com a mão esquerda e, assim com ela bem segura… SLAP! A bochecha ficava vermelha até à hora do almoço.
– “Hoje a professora bateu-te! Foi porque mereceste!”.

No Ciclo Preparatório frequentei a actual EB2/3 Nadir Afonso. Caminhava 40 minutos para chegar à escola, atravessando a pé quase toda a cidade. Depois o “Liceu” e por último a “Técnica” (os flavienses entendem-me). Lembro-me que, depois de ter ingressado na Universidade do Minho, nas férias do verão, sempre que me cruzava com Prof. H na rua ela passou a sorrir-me como nunca o fazia e fez antes. Nessa altura percebi que sentia orgulho em mim. Nós éramos muito pobres e a miúda da foto ninguém imaginava, um dia, “doutora”. Eu era/sou um dos triunfos profissionais da Prof. H.

Tenho 3 fotos da escola primária. Recordo-me da minha mãe se recusar a comprar as fotos, por serem “caras, que nós não tínhamos dinheiro”. Lembro-me que a Prof. H acabava, por fim, por as pagar e oferecer à minha mãe. Em troca, e por ser a minha mãe a mulher mais prendada da rua, os serviços de costura como bainhas, virar colarinhos de camisas, casacos de tricot, etc., eram feitos lá em casa.

Quis o destino que hoje eu também fosse professora, mas de Informática. Lamentavelmente, passámos do 80 para o -8. No presente ano lectivo, tenho alunos do 10.º e 11.º ano. São todos da minha altura e/ou BEM maiores. Numa pequena sala com 14 computadores chego a ter 28-29 alunos. Todos eles gostam de tecnologia, mas não “propriamente” de fazer o que lhes peço… Grito, ralho, reclamo e, quando me exalto mais (confesso!), dou-lhes um cascudo… Só que eles gostam! Ainda se põem a jeito…

Se hoje vos escrevo, aqui, com alguma correcção, se consegui entrar na Universidade, concluir o Curso de Matemática e Ciências da Computação, devo-o aos grandes mestres que tive. A primeira e mais importante, sem menosprezar os demais, foi, sem dúvida, a Prof. H.

Já depois dos 18, as minhas primeiras mesas de voto foram na minha sala da Escola do Caneiro. Afinal, o raio da cana-da-Índia não era assim tão comprida! A sala que a minha memória guardava enorme era, afinal, bem pequena. Hoje, aquela mulher que cheguei a odiar, que me bateu, não me derrubou, fez-me mais forte.

PS – O meu padrinho Rui Varela e a sua esposa Maria José, devem ser das poucas pessoas que me reconhecem na foto. Também eles foram vizinhos da Prof. H.
Muitas pessoas talvez se lembrem também do meu sinal “à Catarina Furtado”, que me acompanhou até há uns 15 anos.

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